terça-feira, 5 de junho de 2012

STJ - Convenções contra bitributação prevalecem sobre legislação de Imposto de Renda

Nobres amigos,

O STJ decidiu na forma da notícia abaixo que as convenções internacionais prevalecem sobre a legislação tributária interna, sob a alegação de que o conflito entre lei tributária e convenção internacional resolve-se pelo critério da especialidade da norma, não se tratando de revogação da lei pela convenção.

Deveras, a Convenção de Viena de 1969, em seu art. 2º define tratados internacionais como “acordo internacional celebrado por escrito entre Estados e regidos pelo direito internacional, quer conste de um instrumento único, quer de dois ou mais instrumentos conexos, qualquer que seja sua denominação particular”.

Tratando-se da integração da norma internacional ao direito interno, primeiro há que se observar que a competência para manter relações com Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais é dada pela CF à União, conforme dispõe o art. 21, I, que diz:

“Art. 21. Compete à União:
I - manter relações com Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais;”

O art. 84, VIII, confere ao presidente da república, privativamente, a competência para celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos ao referendo do Congresso Nacional. Referendo este exigido para aqueles tratados ou acordos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional, como reza o art. 49, I, da CF.

No que tange as teorias há que observar que a teoria monista, conforme informa o texto de Felipe Ferre utilizando-se das palavras de Alberto Xavier, o direito constitui uma unidade de que a ordem interna como a ordem internacional constituem meras manifestações. Já a teoria dualista, ainda de acordo com os ensinamentos de Felipe Ferre, há uma diversidade de fontes do direito, e essa diversidade faz nascer duas ordens jurídicas, uma de direito interno e outra de direito externo. Cumpre ressaltar que o Brasil adotou a teoria dualista, ficando as normas de direito internacional, para que possam ser aplicadas no direito interno, dependentes da produção de normas de idêntico conteúdo neste plano.

Os tratados internacionais integram o ordenamento nacional, desde que aprovados por Decreto Legislativo do Congresso.

Nas palavras de Paulo de Barros Carvalho, “os tratados e convenções internacionais, bem como os convênios interestaduais, não são portadores de força vinculante. É imperioso, por decorrência do princípio da legalidade, que a ordem jurídica recolha a matéria desses atos multilaterais de vontade, sem o que não se da a produção de normas válidas no direito pátrio. E é precisamente por essa razão que o decreto legislativo assume importância significativa como instrumento primário de introdução de regras tributárias.”

Ora, sendo norma que integra o sistema jurídico ela será cogente, aplicando-se as sanções por ele vinculadas, tendo em vista a legalidade e a tipicidade para a aplicação de penalidades, a quem vier descumpri-las.

Decerto, há divergência sobre a existência de hierarquia entre os tratados internacionais e a legislação interna.

O Min. Francisco Rezek[1], abordando o tema dos tratados internacionais, procurou delimitar o problema:

“Posto o tratado em confronto com uma lei que hostiliza de algum modo, e que é de produção mais recente, a questão não é saber se o tratado, por sua própria qualidade, há de prevalecer assim mesmo; é de saber se a lei doméstica tem algum vício congênito, pelo fato de ter sido produzida em desobediência ao art. 98 da Lei Complementar, que diz que tratados hão de ser observados na produção legislativa doméstica que viceja posteriormente. A esse respeito aguarda-se alguma produção doutrinária que oriente a jurisprudência”.

O julgado do STF que costuma ser citado como precedente sobre a matéria é o RE 80.004/SE, rel. p/ o acórdão o Min. Cunha Peixoto, em que o STF decidiu no sentido da inexistência de hierarquia e da possibilidade, portanto, de lei interna posterior ao tratado, ser aplicada validamente.

Particularmente, entendo que o tratado internacional não pode ser revogado por lei interna posterior. Em verdade, entendo que o tratado internacional é norma infraconstitucional e supra legal.

Ora, o tratado internacional somente pode ser revogado pela denúncia, e é competente para denunciar tratado internacional o chefe do executivo, ou seja, ao Presidente da República. Com efeito, a denúncia não é ato interno, mas sim ato externo, sendo firmado no plano internacional. Sendo assim, não poderá haver “denúcia” de tratado por lei interna.

No mais, confiram a decisão do STJ.

Forte abraço a todos,


STJ - Convenções contra bitributação prevalecem sobre legislação de Imposto de Renda
Publicado em 5 de Junho de 2012 às 09h35

A fazenda nacional não pode exigir retenção de Imposto de Renda na fonte em caso de serviços prestados a cliente nacional por empresa estrangeira não estabelecida no Brasil. Para a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os acordos internacionais contra bitributação são especiais em relação à lei que trata do Imposto de Renda.

O caso diz respeito a convenções firmadas pelo Brasil com Alemanha e Canadá. A decisão contraria a pretensão da fazenda de cobrar, na fonte, a título de imposto sobre rendimento, 25% do pagamento feito pela empresa nacional à estrangeira. Os serviços dizem respeito a contratos de prestação de assistência técnica e de serviços técnicos sem transferência de tecnologia.

Segundo a fazenda, o montante não poderia ser classificado como lucro da empresa estrangeira, já que esse lucro só seria conhecido ao final do exercício. O pagamento não constituiria lucro, mas apenas envio de receita. A convenção excluiria apenas a incidência da tributação sobre lucros. Além disso, a lei nacional deveria se sobrepor às convenções, anteriores à Constituição.

Lucro operacional

O ministro Castro Meira, porém, apontou que o conceito de lucro apresentado pela fazenda nacional não corresponde ao previsto nas convenções. Conforme o relator, o termo “lucro da empresa estrangeira” contido nas duas convenções não se refere ao lucro real, mas ao “lucro operacional”.

“A tese é engenhosa, mas não convence”, afirmou o ministro. “É regra de hermenêutica que devem ser rechaçadas as interpretações que levem ao absurdo, como é o caso da interpretação aqui defendida pela fazenda nacional”, completou.

“Do contrário, não haveria materialidade possível sobre a qual incidir o dispositivo, porque todo e qualquer pagamento ou remuneração remetido ao estrangeiro está - e estará sempre - sujeito a adições e subtrações ao longo do exercício financeiro”, esclareceu.

“A tributação do rendimento somente no estado de destino permite que lá sejam realizados os ajustes necessários à apuração do lucro efetivamente tributável. Caso se admita a retenção antecipada - e portanto, definitiva - do tributo na fonte pagadora, como pretende a fazenda nacional, serão inviáveis os referidos ajustes, afastando-se a possibilidade de compensação se apurado lucro real negativo no final do exercício financeiro”, afirmou Castro Meira.

Revogação funcional

Quanto ao alegado conflito entre a lei tributária interna e as convenções internacionais, o ministro apontou que ele deve ser resolvido segundo o critério de especialidade da norma. Não se trataria, portanto, de revogação própria da lei pela convenção.

“A norma interna perde a sua aplicabilidade naquele caso específico, mas não perde a sua existência ou validade em relação ao sistema normativo interno. Ocorre uma revogação funcional”, afirmou o relator.

“A prevalência dos tratados internacionais tributários decorre não do fato de serem normas internacionais, e muito menos de qualquer relação hierárquica, mas de serem especiais em relação às normas internas”, completou.

Globalização

O ministro apontou ainda que a bitributação vincula-se à soberania nacional e pode ser exercida pelos estados nacionais. Porém, constitui “patologia tributária”, combatida por meio de acordos bi ou multilaterais, por meio dos quais as partes transacionam a não incidência de certos tributos em certas condições.

“Ocorre que, na prática, quando os rendimentos são disponibilizados e devem ser submetidos à tributação, o fisco quase sempre adota uma interpretação literal e restritiva das normas convencionais, o que culmina com a não aplicação do acordo. É justamente o caso dos autos”, asseverou.

Processo relacionado: REsp 1161467

Fonte: Superior Tribunal de Justiça


[1] RDT nº 67, Ed. Malheiros, p. 94.

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