Interessante
o artigo confeccionado por Angélica Petian e Mario José Corteze sobre a
possibilidade de utilização da modalidade pregão para licitar serviços de
engenharia.
Confiram.
Abraço,
Pregão
para serviços de engenharia é discussão antiga
A
modalidade de licitação denominada pregão, que trouxe uma nova dinâmica para as
licitações no Brasil, e teve sua origem na Lei 9.472/97 — que a criou para uso
da Agência Nacional de Telecomunicações —, é atualmente regida pela Lei
10.520/02, que já completou dez anos, mas ainda enseja dúvidas àqueles que a
aplicam.
Uma
das grandes celeumas em relação ao pregão é seu cabimento para obras e serviços
de engenharia, dada a diferença de tratamento dispensado ao tema pelos Decretos
Federais 3.555/2000 e 5.450/2005 e pela Lei 10.520/2002.
O
Decreto 3.555, que regulamenta o pregão no âmbito da União, foi editado sob a
disciplina da Medida Provisória 2.026-3, que criava a nova modalidade de
licitação para a aquisição de bens e contratação de serviços de natureza comum
apenas em âmbito federal. Naquela ocasião, houve expressa vedação à utilização
do pregão para as contratações de obras e serviços de engenharia, nos termos do
artigo 5º do referido Decreto.
Quando
da edição da Lei 10.520/02, que criou o pregão como modalidade licitatória a
ser utilizada por todos os entes federados, a vedação não foi reproduzida,
passando alguns a concluir pela possibilidade de utilizar o pregão para
selecionar propostas tendentes à execução de serviços de engenharia que
pudessem ser enquadrados como de natureza comum. Esse foi o posicionamento
adotado pelo Tribunal de Contas da União ao entender que “a lei que disciplina
a modalidade pregão não proíbe aplicá-la a serviços comuns de engenharia. E não
é porque não seja expressa em aceitar o pregão nesse propósito que se deva
entendê-la como proibitiva” (Acórdão 2079/2007 – Plenário).
Tempos
depois, a União editou o Decreto 5.450/2005 que regulamenta o pregão na forma
eletrônica e proibiu, expressamente, a adoção da modalidade pregão para a
contratação de obras de engenharia, bem como para locações imobiliárias e
alienações em geral, silenciando sobre os serviços de engenharia.
A
discussão foi, então, retomada. Os defensores da aplicação do pregão para
serviços de engenharia passaram a valer-se do silêncio do texto legal para
afirmar seu cabimento. Ressalte-se que contavam com a interpretação ampliativa
do conceito de serviços de natureza comum adotada pelo Tribunal de Contas da
União, conforme se depreende do Acórdão 555/2008 - Plenário. De outro lado,
contudo, estavam os refratários à adoção do pregão para serviços de engenharia,
por entender que a especificidade deles não permitia seu enquadramento no
conceito de “comum”, independente de o texto normativo não ter vedado sua
utilização.
Pois
bem, diante de toda essa balbúrdia legislativa e considerando que a expressão
“serviços de natureza comum” está compreendida no elenco dos conceitos
jurídicos indeterminados, passaram a serem proferidas tanto decisões que
aprovavam a utilização do pregão para licitar serviços de engenharia como que
reprovavam a mesma conduta.
Recentemente,
mais um elemento foi adicionado a este cenário. O Plenário do Conselho Federal
de Engenharia e Agronomia (Confea) aprovou, em 03 de dezembro de 2012, a Decisão PL-2467/2012,
por meio da qual definiu que os serviços de engenharia que exijam habilitação
legal para sua elaboração ou execução, com a obrigatoriedade de participação de
um engenheiro e emissão da devida anotação de responsabilidade técnica — ART
perante o Crea não podem ser classificados como comuns e, portanto, não podem
ser licitados por pregão.
Para
o Confea, os serviços de engenharia que demandam a execução ou supervisão por
profissional legalmente habilitado não podem ser enquadrados no gênero “comum”
porque são de natureza intelectual, científica e técnica, fatores que resultam
em ampla complexidade executiva. Assim, para a seleção da proposta mais
vantajosa para a execução desses serviços de engenharia, a Administração terá
que valer-se de uma das modalidades licitatórias previstas na Lei 8.666/93.
Importante
ressaltar que, o Confea não vedou, nem poderia fazê-lo por faltar-lhe
competência para tanto, a adoção da modalidade pregão para serviços de
engenharia, mas, apenas, definiu o que deve ser entendido por serviço de
engenharia de natureza comum e de natureza não comum. De acordo com o critério
adotado pela Decisão PL-2467/2012, todo serviço de engenharia que exigir a
participação de um engenheiro legalmente habilitado não poderá ser enquadrado
como de natureza comum, ficando afastada a utilização do pregão, conforme
disciplina da Lei 10.520/02, especialmente da norma contida em seu artigo 1º,
parágrafo único.
Aguardaremos
as decisões vindouras para ver se os órgãos de controle e o Poder Judiciário
considerarão essa decisão do Confea e como hão de interpretá-la.
A
nosso ver, a decisão do Confea não só é acertada como é bastante útil para a
Administração Pública. Ao eleger um critério objetivo para classificar os
serviços de engenharia em comuns e não-comuns, qual seja, a participação de um
engenheiro legalmente habilitado, o Confea ajuda a delimitar o conceito de
serviços de natureza comum e com isso, diminui a zona de incerteza do conceito,
tornando mais fácil sua aplicação.
Ademais,
diversamente do entendimento do Tribunal de Contas da União, nos parece que,
sempre que houver dúvida quanto à classificação de determinado serviço como
comum ou não, para fins de adoção da modalidade de licitação pregão, a
Administração deverá escolher uma daquelas modalidades prescritas pela Lei
8.666/93 — convite, tomada de preços ou concorrência —, já que o pregão foi
criado para objetos com características padronizadas, disponíveis no mercado e
por essa razão deve ser utilizado apenas nessas hipóteses.
É
regra básica da hermenêutica que as normas excepcionais devem ser interpretadas
restritivamente e, no campo das modalidades de licitação, certamente o
pregão apresenta-se como modalidade exceção, cabível somente para a aquisição
ou contratação de bens de natureza comum, enquanto as modalidades previstas na
Lei 8.666/93, ao menos aquelas que denominamos de ordinárias (convite, tomada
de preços ou concorrência), têm um amplíssimo espectro de aplicação.
Angélica
Petian é integrante do Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos da
Infraestrutura (Ibeji).
Mário
José Corteze é integrante do Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos
da Infraestrutura (Ibeji).
Fonte: Revista Consultor
Jurídico, 24 de janeiro de 2013
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