Minha galera... para um melhor entendimento sobre a possibilidade
de exclusão do sócio minoritário na Sociedade Limitada, confiram o texto do
prof. Armando Luiz Rovai publicado originalmente no CONJUR.
Boa leitura e abraço,
Exclusão de sócios enfrenta insegurança jurídica
Sabe-se que desde o ano de 2002, com a entrada em vigor do
Código Civil, há enormes dificuldades para se operacionalizar uma expulsão
extrajudicial de sócio minoritário, mesmo que esse sócio esteja colocando em
risco a continuidade das atividades negociais. Em outras palavras, expulsar
extrajudicialmente um sócio minoritário, mesmo que haja previsão contratual,
tem sido uma tarefa árdua, delicada e que requer, principalmente, muita, muita
sorte.
Consigno isso sem qualquer tipo de ironia, mas porque,
efetivamente, vivencio no dia a dia a aflição dos operadores do direito que
buscam uma via que deveria ser facilitadora e alternativa ao já saturado Poder
Judiciário. A realidade apresentada é uma legislação cheia de dubiedades e
entraves burocráticos, combinados a um hórrido preparo técnico das juntas
comerciais, o que gera uma verdadeira loteria registrária, onde alguns
documentos passam e outros não!
Por uma questão metodológica, vou aqui relacionar apenas
algumas das várias ambiguidades que residem na operacionalização da expulsão
extrajudicial de sócio, o que facilitará a compreensão do leitor. O primeiro
ponto encontra-se na redação dada ao artigo 1.085 do CC. Pela letra da lei, se
houver uma sociedade com dois sócios, um com 99,9% das quotas e o minoritário for
aquele que estiver praticando atos de inegável gravidade, mesmo que prevista a
cláusula de exclusão, a mesma não poderá ocorrer, em razão da necessidade de
constar mais de dois sócios no quadro societário.
Registre-se, contudo, que na recente 1ª Jornada de Direito
Comercial do Superior Tribunal de Justiça, tal desacerto legislativo foi objeto
de retificação pelo Enunciado 17 dos enunciados aprovados. Depreende-se do
aludido documento que: na sociedade limitada com dois sócios, o sócio titular
de mais da metade do capital social pode excluir extrajudicialmente o sócio
minoritário desde que atendidas as exigências materiais e procedimentais
previstas no artigo 1.085, caput e parágrafo único, do CC.
Cumpre dizer, entretanto, que inobstante esses enunciados serem
integrados à doutrina e muitas vezes considerados tanto nas vias
administrativas, como por magistrados nas suas decisões, é necessário saber se
as juntas comerciais permitirão que esses expedientes sejam incorporados no seu
dia a dia ou, se, mais uma vez, darão de ombros aos avanços do Direito
Comercial. Aliás, esse é um questionamento que também deve ser feito ao
Departamento Nacional de Registro do Comércio.
Outro elemento complicador acerca da expulsão extrajudicial
está no que o legislador quis dizer no caput do artigo 1085 do CC com a
expressão "desde que prevista neste a exclusão por justa causa".
Desde já, deixando de lado o conceito de justa causa da Justiça do Trabalho,
uma vez que não há hierarquia entre os sócios, o legislador não deixou claro
seu significado.
Mesmo com previsão contratual, é uma tarefa árdua, delicada
e requer sorte
Numa tentativa de desvendar esse mistério e propor um
significado a esse arcano, uma singela construção de pensamentos inspirada em
Norberto Bobbio pode auxiliar: Bobbio, em seu último livro, Elogio à
Serenidade, insiste que a tolerância é recíproca: "para que exista
tolerância é preciso que se esteja ao menos em dois. Uma situação de tolerância
existe quando um tolera o outro". Embasado, pois, no pensamento de Bobbio,
tenho que a "justa causa" se caracteriza pela falta de tolerância e o
surgimento do estado de prepotência - quando o estado de tolerância deixa de
estar presente, surge, entre os sócios, o estado de prepotência, acarretando o
desajuste que gera o conflito.
Ora, uma sociedade possui estado de harmonia quando seus
pares (sócios) possuem uma convivência regida pelo estado de tolerância; caso
contrário, está configurada a justa causa para expulsão. Mais uma vez o
legislador não andou bem ao obrigar a inserção e detalhamento da justa causa
para as operações de expulsão extrajudicial de sócios; pois não cabe ao
instrumento que vai para registro – com ampla publicidade (uma vez que essa é
umas das principais atribuições do Registro Mercantil) -, escancarar as
entranhas da sociedade.
Por último, naquilo que chamo de liturgia desnecessária, a
exclusão somente poderá ser determinada em reunião ou assembleia especialmente
convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu
comparecimento e o exercício do direito de defesa. Verdadeira panaceia,
considerando que o legislador pretendeu uma medida capaz de sarar os males
acusatórios que pudessem recair no sócio expulso, mas especificamente ineficaz,
vez que independentemente de suas razões e por melhor que fosse a capacidade de
retórica de seu advogado (se estivesse acompanhado na reunião ou assembleia), o
que lhe restaria seria discutir haveres em juízo.
Na prática, a convicção dos sócios majoritários já está
formada desde antes da instalação da reunião. Tudo não passa de um pueril jogo
de cena, servindo apenas para cumprir uma burocracia custosa para a empresa, a
pretexto de proteger o direito de defesa do sócio minoritário que na prática
inexiste. Vê-se, pois, quanto falha e ambígua é a expulsão extrajudicial de
sócio. O direito societário merece um sistema jurídico melhor, mais rápido,
moderno e com maior segurança jurídica. Oxalá melhores dias, com melhores leis.
Armando
Luiz Rovai é doutor em direito pela PUC-SP, Professor de direito
Comercial do Mackenzie e Professor de Direito Comercial da PUC/SP,
Ex-presidente da Junta Comercial do Estado de São Paulo. Conselheiro da OAB/SP.
Presidente da Comissão de Estudos de Acompanhamento do Novo Código Comercial.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 26 de abril de 2013
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