quinta-feira, 26 de julho de 2012

SERVIÇO DE RESTAURAÇÃO: INSCRIÇÃO NA MATRICULA CEI E RESPONSABILIDADE PELA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA


Em outubro de 2011 uma construtora (que aqui vou chamar de S¹) me procurou para lhe responder a uma consulta sobre um contrato de prestação de serviço de restauração com que este firmou com um cliente seu (que aqui chamarei de C¹).

A sociedade S¹ informa que já concluiu o objeto do contrato, entretanto tem encontrado resistência no recebimento das faturas emitidas sob a alegação de que para o serviço em tela se faz necessário a inscrição em matricula CEI (Cadastro Específico do INSS), bem como que seja retido 11% (onze por cento) sobre o valor de cada uma da Notas Fiscais/Faturas emitidas a título de contribuição previdenciária (INSS).

Sendo assim, S¹ questiona:

a) para o serviço de restauração é obrigatório a matricula CEI?

b) no serviço de restauração em tela, é obrigatório que C¹ realize a retenção de 11% sobre as Notas Fiscais/Faturas emitidas pela S¹?

Delimitada a questão, passa-se então as respostas com a devida fundamentação.


DA DISPENSA DA CEI EM CASO DE SERVIÇO DE RESTAURAÇÃO

Saber se é necessário a matricula CEI é fato decisivo para o desfecho deste parecer.

Sobre o tema deve-se conferir a legislação previdenciária, especialmente o quanto estabelece a Instrução Normativa nº 971/2009 da Secretaria da Receita Federal do Brasil, que em seu art. 19, II, indica todos aqueles que devem realizar a inscrição na matricula CEI, informando que:

Art. 19. A inscrição ou a matrícula serão efetuadas, conforme o caso:

(...)
II - no CEI, no prazo de 30 (trinta) dias contados do início de suas atividades, para o equiparado à empresa, quando for o caso, e obra de construção civil, sendo responsável pela matrícula:

a) o equiparado à empresa isenta de registro no CNPJ;
b) o proprietário do imóvel, o dono da obra ou o incorporador de construção civil, pessoa física ou pessoa jurídica;
c) a empresa construtora, quando contratada para execução de obra por empreitada total, observado o disposto no art. 27;
d) a empresa líder, na contratação de obra de construção civil a ser realizada por consórcio mediante empreitada total de obra de construção civil;
e) o produtor rural contribuinte individual e o segurado especial;
f) o consórcio simplificado de produtores rurais, conforme definido no inciso XIX do art. 165;
g) o titular de cartório, sendo a matrícula emitida no nome do titular, ainda que a respectiva serventia seja registrada no CNPJ;
h) a pessoa física não-produtor rural que adquire produção rural para venda, no varejo, a consumidor pessoa física, nos termos do inciso II do § 7º do art. 200 do Regulamento da Previdência Social (RPS), aprovado pelo Decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999.

Entretanto, o próprio regulamento, em seu art. 25, informa as hipóteses de dispensa da matricula CEI, listando que:

Art. 25. Estão dispensados de matrícula no CEI:

I - os serviços de construção civil, tais como os destacados no Anexo VII com a expressão "(SERVIÇO)" ou "(SERVIÇOS)", independentemente da forma de contratação;
II - a construção sem mão-de-obra remunerada, de acordo com o disposto no inciso I do art. 370;
III - a reforma de pequeno valor, assim conceituada no inciso V do art. 322.

No caso em tela, saber se a S¹ é obrigada a realizar a inscrição da matricula CEI ou não, é investigar o objeto do contrato firmado entre as partes, ou seja, entre ela e a C¹.

Com efeito, tratou-se de SERVIÇO DE RESTAURAÇÃO, que não se confunde nem com construção, reforma e/ou acréscimo.

Ora, o INSS trata o serviço de restauração como serviço ou serviço de profissão regulamentada para este fim, e não como obra civil. Decerto, a restauração é o conjunto de atividades que visa restabelecer danos decorrentes do tempo em imóvel que pertence ao patrimônio histórico. Para a prestação do serviço de restauração participam profissionais tais como historiador, restaurador, arquiteto, químico, arqueólogo, entre outros, e não somente engenheiros. Por fim, restauração seria a manutenção do prédio.

Ademais, considerando o quanto estipulado no Anexo II da IN nº 971/2009, o serviço de restauração como dispensado de inscrição na matricula CEI por tratar-se de serviço de construção civil, pois se encontra insculpido nos itens 4.330-4-02, 4330-4-03 e 4.333-4-04, que se transcreve abaixo:

4330-4/02 INSTALAÇÃO DE PORTAS, JANELAS, TETOS, DIVISÓRIAS E ARMÁRIOS EMBUTIDOS DE QUALQUER MATERIAL (SERVIÇO)
Esta Subclasse compreende:
- a instalação de esquadrias de metal, madeira ou qualquer outro material, quando não realizada pelo fabricante;
- a instalação de portas, janelas, alisares de portas e janelas, cozinhas equipadas, escadas, equipamentos para lojas comerciais e similares, em madeira e outros materiais, quando não realizada pelo fabricante;
- a execução de trabalhos em madeira em interiores, quando não realizada pelo fabricante;
- a instalação ou montagem de estandes para feiras e eventos diversos quando não integrada à atividade de criação.
(...)

4330-4/03 OBRAS DE ACABAMENTO EM GESSO E ESTUQUE (SERVIÇO)
Esta Subclasse compreende:
- os serviços de acabamento em gesso e estuque.
(...)

4330-4/04 SERVIÇOS DE PINTURA DE EDIFÍCIOS EM GERAL (SERVIÇO)
Esta Subclasse compreende:
- os serviços de pintura, interior e exterior, em edificações de qualquer tipo;
- os serviços de pintura em obras de engenharia civil.
(...)

Conclui-se então que para a realização do contrato de serviço de restauração firmado entre as partes a S¹ não necessita de matricula CEI.

DA DISPENSA DO INSTITUTO DA RETENÇÃO DE 11%

Vencida a questão de dispensa da matricula CEI, cabe então enfrentar a questão da retenção de 11% que C¹ pretende realizar sobre as Notas Fiscais/Faturas emitidas pela S¹.

No caso em tela, por tratar-se de serviço de restauração, o instituto da retenção sobre as Notas Fiscais / Faturas encontra-se previsto no art. 30 da Lei nº 8.212/1991, que diz:

Art. 30. A arrecadação e o recolhimento das contribuições ou de outras importâncias devidas à Seguridade Social obedecem às seguintes normas:
(...)
VI - o proprietário, o incorporador definido na Lei nº 4.591, de 16 de dezembro de 1964, o dono da obra ou condômino da unidade imobiliária, qualquer que seja a forma de contratação da construção, reforma ou acréscimo, são solidários com o construtor, e estes com a subempreiteira, pelo cumprimento das obrigações para com a Seguridade Social, ressalvado o seu direito regressivo contra o executor ou contratante da obra e admitida a retenção de importância a este devida para garantia do cumprimento dessas obrigações, não se aplicando, em qualquer hipótese, o benefício de ordem

Ora, pretende C¹ realizar a retenção de 11% sobre as Notas Fiscais/Faturas para fugir da responsabilidade solidária insculpida no trecho legal acima destacado. Contudo, no caso em tela, dispensa-se que seja realizada a retenção em virtude de tratar-se de empreitada total, na forma do quanto determina o art. 149 da IN nº 971/2009, que diz:

Art. 149. Não se aplica o instituto da retenção:
(...)
II - à empreitada total, conforme definida na alínea "a" do inciso XXVII do caput e no § 1º, ambos do art. 322, aplicando-se, nesse caso, o instituto da solidariedade, conforme disposições previstas na Seção III do Capítulo IX deste Título, observado o disposto no art. 164 e no inciso IV do § 2º do art. 151;

Com efeito, o contrato de prestação de serviço de restauração firmado entre as parte deu-se na modalidade de empreitada total, uma vez que S¹ assumiu a responsabilidade direta pela execução de todos os serviços necessários à realização da restauração, compreendido todos os projetos a ela inerentes.

Desta forma, pela passagem de regulamento acima transcrita, resta evidente que dispensa-se no caso em tela que C¹ realize a retenção de 11% sobre as Notas Fiscais / Faturas emitidas.

Por óbvio, C¹ deve se resguardar para não enfrentar problemas futuros com a solidariedade já indicada acima, devendo S¹ lhe municiar de documentos comprobatórios suficientes a elidir a responsabilidade solidária tributária do tomador do serviço. Nesse sentido o art. 163 da IN nº 971/2009 informa que:

Art. 163. Na contratação de obra de construção civil mediante empreitada total, a partir de fevereiro de 1999, observado o disposto no art. 157, a responsabilidade solidária do proprietário do imóvel, do dono da obra, do incorporador ou do condômino da unidade imobiliária, com a empresa construtora, será elidida com a comprovação do recolhimento, conforme o caso:

I - das contribuições sociais incidentes sobre a remuneração contida na folha de pagamento dos segurados utilizados na prestação de serviços e respectiva GFIP, corroborada por escrituração contábil, se o valor recolhido for inferior ao indiretamente aferido com base nas notas fiscais, nas faturas ou nos recibos de prestação de serviços, na forma estabelecida na Seção Única do Capítulo III do Título IV;
II - das contribuições sociais incidentes sobre a remuneração da mão-de-obra contida em nota fiscal ou fatura correspondente aos serviços executados, aferidas indiretamente na forma estabelecida na Seção Única do Capítulo III do Título IV, caso a contratada não apresente a escrituração contábil formalizada na época da regularização da obra;
III - das retenções efetuadas pela empresa contratante, no uso da faculdade prevista no art. 164, com base nas notas fiscais, nas faturas ou nos recibos de prestação de serviços emitidos pela construtora contratada mediante empreitada total;
IV - das retenções efetuadas com base nas notas fiscais, nas faturas ou nos recibos de prestação de serviços emitidos pelas subempreiteiras, que tenham vinculação inequívoca à obra.

Ora, utilizando-se dos ensinamentos do doutrinador e Juiz Federal da 4ª Região, Dr. Leandro Paulsen[1], “caberá ao proprietário, incorporador, dono da obra ou condômino, quando dos pagamentos do construtor, exigir a comprovação do recolhimento das contribuições previdenciárias, sob pena de caracterização da sua responsabilidade solidária”.

Observa-se que com o comprovante de recolhimento das contribuições previdenciárias por S¹, C¹ elide a responsabilidade solidária, não se fazendo necessário então que seja retido 11% sobre as Notas Fiscais / Faturas emitidas para o serviço. Nesse sentido também é a opinião do professor e Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil, Dr. Ivan Kertzman[2], que informa:

“A responsabilidade solidária, entretanto, persiste para obras de construção civil contratadas por empreitada total, ou seja, quando toda obra é executada por apenas uma prestador. Nesse caso, o contratante pode optar pela retenção, elidindo-se da responsabilidade, ou escolher o instituto da solidariedade.

Quando a contratante de obra de construção civil por empreitada total optar pela solidariedade, deve manter cópias das folhas de pagamento, GFIP (documento declaratório) e GPS (documento de arrecadação)”. (grifo nosso)

Sendo assim, C¹ elidiria sua responsabilidade ao exigir a apresentação por S¹ do recolhimento das contribuições previdenciárias em tela.

Decerto, já tendo S¹ realizado o recolhimento das contribuições previdenciária em questão, não caberia C¹ realizar a retenção justamente para não haver um bis in idem (recolhimento duplo pela SRFB sobre o mesmo fato gerador). Corroborando com tal entendimento a jurisprudência pátria já decidiu que:

CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. O proprietário, o dono da obra ou o condômino da unidade imobiliária, qualquer que seja a forma de contratação da construção, reforma ou acréscimo, são solidariamente responsáveis com o construtor pelo cumprimento das obrigações providenciarias. Porém, se as contribuições previdenciárias incidentes sobre a construção civil são recolhidas pelo executor da obra, não há que cogitar-se de exigir contribuições do tomador dos serviços, sob pena de bis in idem. Apelação e remessa oficial desprovida.
(TRF4, 2ª T., AC 2001.04.01.075913-3/RS, Dês. Fed. JOÃO SURREAUX CHAGAS, set/2003)

Resta patente então que tendo S¹ entregue a C¹ as guias de GFIP e GPS devidamente recolhidas, não cabe a contratante realizar a retenção sobre as Notas Fiscais/ Fatura, até mesmo por que elidida a solidariedade, não restando a este qualquer possibilidade de passivo tributário decorrente do serviço de restauração prestado.

CONCLUSÃO


Diante do exposto, resta patente que para o serviço de restauração não se faz necessário inscrição de matricula CEI, bem como com o recolhimento de GPS e GFIP realizado pelo contratado não cabe a Contratante realizar a retenção de 11% sobre as Notas Fiscais / Faturas emitidas.


[1] Paulsen, Leandro. Direito tributário: constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 13. ed. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora; ESMAF, 2011, p. 975. 
[2] Kertzman, Ivan. Curso prático de direito previdenciário. 8. ed. – Salvador: Editora Jus Podivm, 2011, p. 243.  

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